Se você já maratonou França e o Labirinto no Spotify, é bem possível que sua cabeça tenha explodido com a tecnologia binaural, que te coloca na pele do detetive Nelson França (Selton Mello), seja nos momentos de calmaria ou, principalmente, nos perrengues.
A áudiossérie produzida pela Nonsense Creations, a produtora de Jovem Nerd, nasceu justamente da vontade de Alexandre Ottoni e Deive Pazos de utilizar a ferramenta de áudio 3D a serviço de uma narrativa original. A responsabilidade de traduzir, em áudio, tudo o que acontece com e ao redor de França ficou com a equipe da Ultrassom Music Ideas, sob o supervisor de som Caio Gox.
Ao NerdBunker, Gox, profissional de áudio desde 2010, contou como ocorreram as primeiras experiências logo após o convite para o projeto:
“Recebemos o convite através do Spotify. Foi aí que lemos o roteiro e entendemos que o desafio seria trazer a produção binaural da forma mais imersiva possível. É algo que a história demanda, mas também apresenta muitos espaços para ideias sonoras, narrativas, dramatúrgicas. Caiu como uma luva para as experiências com o binaural.”
Além da supervisão geral da pós-produção, Gox colocou a mão na massa também no design de som e foley (processo para recriar sons de objetos). O profissional atuou, nesta fase, em parceria com Lucas Amadeu, Pamela Gentil e Fernando Recchia.
Na trama, o detetive particular Nelson França volta à ação quando um novo crime desenterra um perigoso serial killer, que ele julgava ser coisa do passado. Ele, então, deve trilhar o labirinto da investigação enquanto lida com os problemas pessoais e um pequeno detalhe: o fato de ter perdido a visão.
O trabalho de Caio Gox consistiu em montar todo o desenho de som dos 13 episódios, dando vida e intensidade à jornada de Nelson França ao longo da narrativa. Sem spoilers, é dele, por exemplo, o trabalho de rechear episódios como o terceiro capítulo, no qual França visita um presídio em rebelião, e o quinto, que coloca o herói no meio de uma Cracolândia, para a investigação. Gox diz:
“No roteiro, desde a primeira vez, eu sabia que esses episódios seriam os mais desafiadores. Tínhamos que reproduzir, com verossimilhança e fidelidade, uma Cracolândia e um presídio. Rolou muita pesquisa, precisei descobrir como as coisas acontecem, de verdade, nesses locais. Consultei pessoas que passaram por experiências parecidas. Tudo de forma que servisse à narrativa.”
Feito o trabalho de montagem e desenho de som, quem entra em ação é a turma da mixagem, representada por André Tadeu e Carlos Paes. Coube à dupla organizar o que pode ser ouvido, com que intensidade e em que momento, ao longo da jornada de França e o Labirinto. Em outras palavras, são aos dois especialistas que você deve agradecer (ou culpar) pelas emoções intensas no seu fone de ouvido.
André Tadeu destaca que, mais do que uma tecnologia, o áudio binaural é, acima de tudo, uma experiência. No caso de França e o Labirinto, o trabalho de manipulação de sons foi até mais importante do que a própria captação do áudio em formato 3D, como popularizado, por exemplo, em vídeos de ASMR:
“Se trabalhássemos só com o microfone, seria como gravar uma cena com uma câmera de vídeo, mas com a lente fechada. Imagine colocar o Selton Mello no meio da rua com o microfone para gravar todos os ambientes, ou reunirmos centenas de atores num estúdio para fazer a captação ao mesmo tempo. Não seria um resultado tão legal. Com a tecnologia de hoje, conseguimos criar espaços e situações com bancos de áudios, mexendo em volumes, intensidade de sons, toda a sensação de movimento.”
A noção de espaço foi também um grande desafio para a equipe, que buscou ao máximo inserir o ouvinte na pele de França, até nos mínimos detalhes. Caio Gox conta que o trabalho exigiu até a criação de mapas de ambientes para reproduzir ao máximo sequências com a maior fidelidade:
“Cheguei a andar na rua e contar passos de uma caminhada. O andar de França não podia ficar muito lento, longo demais… Precisávamos equilibrar uma caminhada realista e que tudo que precisasse acontecer ao longo dela tivesse o devido tempo. Quem ouvir, terá uma imagem na mente, guiada pelo som, e era algo que também precisávamos ter no processo de pós-produção. Todos estávamos alinhados para que o trabalho viesse da melhor forma.”
André Tadeu completa:
“Desenhamos mapas para guiar essas perguntas. Como é o apartamento do França? Onde está a cozinha? A televisão, o rádio, a prateleira… Havia muito diálogo, não só com o material que Caio e equipe mandavam, como também com o roteiro aberto a todo instante e sugestões de Alexandre e Deive.”
O espírito de colaboração, presente em todas as etapas do projeto, foi também o berço de diversas ideias, como até a própria personalidade do personagem. André Tadeu destaca que a própria situação em que França se encontra ao longo da série é mostrada pelo desenho de som:
“Houve um momento em que eu achava que os passos do França estavam pouco aparentes, aí coloquei um som um pouco mais grave, com chão de madeira. Do ponto de vista técnico, aparecia melhor, mas em conversas com o Deive, definimos que o França não podia ter uma pisada assim. Ele precisava estar descalço, f*dido! Piso frio, mesmo! [risos] E a série é cheia de coisas do tipo. Como a gente mostra que o França está na pior? É o ventilador barulhento, a porta que range…”
Outro ponto destacado pelo mixer são os sutis detalhes que aumentam a imersão do ouvinte na pele de França. Em vez de acompanhar o personagem em terceira pessoa, como seria o costume em filmes e séries de TV, França e o Labirinto coloca o ouvinte “dentro” do investigador. Todas as conversas, diálogos e acontecimentos giram em torno do protagonista, com detalhes que você talvez nem perceba, como resume Caio Gox:
“Há momentos, por exemplo, em que França ouve fitas de uma investigação. Ele não presta atenção em tudo, tem horas que baixamos um pouco o som para sinalizar que ele está entediado. Ou focamos em algo que chama a atenção dele. Além de pequenos detalhes como a movimentação da cabeça, para você ter a noção de que ele está em movimento. Barulhos de couro no sofá, para demonstrar inquietude. São coisas que, talvez, você sinta, mas não saiba que sentiu!”
Os 13 episódios de França e o Labirinto estão disponíveis no Spotify.
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