Iniciada em 2010, a franquia Sobrenatural foi fundamental para estabelecer James Wan como cineasta de horror, mas nunca alçou os mesmos ápices de sua prima mais nova, Invocação do Mal. As semelhanças entre as franquias não ajudaram a original a dar a volta por cima, especialmente após dois filmes que penaram para conquistar a atenção do público.

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Ainda assim, a tensão de uma família atormentada por forças do além segue bastante cativante, e se torna o principal interesse de Sobrenatural: A Porta Vermelha, quinto filme que busca resgatar a franquia com abordagem mais sensível. Nas mãos de Patrick Wilson, ator que vive o pai Josh Lambert, e que aqui estreia como diretor, o longa mergulha na mitologia da saga para entender os danos duradouros na relação familiar dos afetados pelas entidades.

Para isso, a trama agora se volta para Dalton Lambert (Ty Simpkins). Quando tinha apenas 9 anos, como mostrado nos primeiros filmes, se tornou alvo de um espírito obsessor que o colocou em coma, e mais tarde se viu ameaçado quando essa mesma entidade tomou controle de seu pai, Josh (Wilson).

Ainda que as memórias dos incidentes tenham sido bloqueadas na mente de ambos, a relação entre pai e filho nunca se recuperou. Mais de uma década depois, Dalton agora é um jovem de 21 anos prestes a entrar na faculdade. Quando começa a ter visões estranhas, de uma porta vermelha e projeções astrais, o rapaz percebe que precisa revisitar seus traumas do passado.

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Sobrenatural: A Porta Vermelha retoma história de Dalton Lambert para explorar seus traumas reprimidos [Créditos: Divulgação]

O filme reexamina o que realmente é a essência da série, ao mesmo tempo que busca fugir da fórmula estabelecida por James Wan. O esforço é admirável, ainda que ocasionalmente se enrole para tentar se encaixar na mitologia da franquia sem realmente se interessar por explorar o Além e seus fantasmas. Quando foca no lado emotivo, de realmente retratar o distanciamento entre pai e filho, é surpreendentemente eficiente.

Mesmo que a série sempre tenha se vendido pela tensão e sustos, A Porta Vermelha tira seu tempo para desenvolver personagens, e o resultado é bastante positivo. Antes de mostrar realidades paralelas e demônios, há ênfase no estado quebrado em que Josh se encontra, e em como Dalton cresceu desajustado em relação aos demais e à própria família. Curiosamente, o longa é marcado por vários momentos fofos. Algumas cenas bregas, também? Sim, várias, mas é consequência natural de tentar soar genuíno, como um pai buscando as palavras certas para se reconectar com o filho.

Na tensão, a direção de Patrick Wilson tem seus momentos. O cineasta demonstra a influência de James Wan no controle de câmera e uso de espaço, mas se esforça para criar sua própria linguagem, repleta de ameaças fora de foco, de movimentos ousados de câmera, e de momentos agoniantes que nem sempre terminam em sustos.

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Por grande parte do longa, parece que o diretor novato quer ir além da fórmula, e faz um trabalho sólido o bastante. Mas seu esforço também convence nas cenas em que busca servir algo mais familiar ao público. O momento em que Josh é atacado por uma entidade de cara pálida, bem quando está deitado em um aparelho de tomografia, é um dos melhores trechos da franquia — perfeito para dar um pouco mais de emoção e inquietação na próxima tomografia de qualquer espectador.

O maior problema de A Porta Vermelha é tentar conciliar sua história pessoal com a mitologia da franquia Sobrenatural [Créditos: Divulgação]

O maior empecilho é, curiosamente, a tal Porta Vermelha, ou pelo menos o que ela representa. De início, esse misterioso portal para o Além serve para despertar memórias reprimidas em Dalton e Josh. Sua função é colocar a trama nos trilhos, como forma de criar algo em comum entre pai e filho, e para levar o jovem protagonista a explorar seus poderes de mediunidade e projeção astral.

Mas sua utilização vai além do necessário e o longa parece preso pelas amarras da franquia que busca reexaminar. Por muito tempo, o filme consegue unificar seu aspecto dramático e paranormal sob um arco único, mas a pressão para se encaixar na série de filmes gradualmente entorta um pouco as coisas.

É fácil terminar de assistir com dúvidas sobre qual realmente era a ameaça que a Porta Vermelha representava, ou então qual o papel das assombrações nisso tudo, e não são questões injustas. Muito do terceiro ato soa confuso justamente pela insistência em algo que já não tem mais função. O filme fica no limbo ao tentar dividir seus holofotes entre o conflito familiar e o paranormal, sem responder às várias dúvidas que levantou sobre o Além.

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Porém, ainda que se enrole para tentar se encaixar na identidade da franquia, Sobrenatural: A Porta Vermelha é uma ótima adição à série. É raro que uma saga de terror explore as consequências dos horrores em seus personagens, e o longa faz bem ao reencontrar rostos apresentados há 13 anos para demonstrar como traumas reprimidos se instauram, crescem e corrompem a mente e as relações de suas vítimas.

Sobrenatural: A Porta Vermelha já está em cartaz nos cinemas brasileiros.