Nostalgia é um dos temas mais explorados pela indústria da cultura pop nas últimas décadas, justamente porque nós, os fãs, abraçamos (e muito) a temática — o que refletiu em vários filmes, séries e games modernos que se inspiram no retrô. Mas os criadores de Goodboy Galaxy, um novo jogo que está chegando ao Game Boy Advance (sim, você não leu errado), levaram a ideia a outro patamar.

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Goodboy Galaxy é um jogo de plataforma que foi criado por apenas dois desenvolvedores, Rik Nicol e Jeremy Clarke. O projeto teve a ajuda de um financiamento coletivo (com quase 4 mil apoiadores no Kickstarter) e chamou a atenção na internet por ter uma alma saudosista… até demais, alguns diriam.

Afinal, o lançamento é focado em uma plataforma descontinuada da Nintendo: o clássico GBA. Com direito a caixinha, manual e tudo mais!

No entanto, é claro que, para ser um projeto viável, também era preciso alcançar plataformas modernas e mais acessíveis nos dias atuais. Por isso, o título chegará ao PC e Nintendo Switch, em uma “versão melhorada” com gráficos e áudio aprimorados, no início de 2024. Além disso, os desenvolvedores estão vendendo o arquivo do jogo de forma separada.

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Alguns dos itens de recompensa da campanha, com caixinha, manual, trilha sonora e até cartucho translúcido (Imagem: Goodboy Galaxy/Divulgação)

Assim, Goodboy Galaxy é o primeiro jogo comercial do GBA após 2008, ano em que o console portátil parou de receber novos títulos — com Samurai Deeper Kyo, um beat ‘em up japonês, sendo o último e selando o caixão.

O motivo para a escolha da plataforma nostálgica é, na verdade, simples. Nicol e Clarke queriam celebrar os mais de 20 anos do Game Boy Advance, lançado em 2001. Só que encerro esse parágrafo imediatamente para não lembrar que, sim, caro leitor, estamos velhos.

O que importa é que Goodboy Galaxy cumpre bem a tarefa de homenagear o pequeno console! Inspirado em Metroid antigos, ele é um jogo de plataforma focado em exploração, que fará você querer tirar a poeira daquele velho Game Boy no fundo da gaveta.

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“Seja um bom garoto ou se finja de morto”

Em Goodboy Galaxy, você controla Maxwell, um cachorrinho antropomórfico que é viajante espacial. Ele está à procura de ajuda para salvar seu planeta natal que está em apuros, mas sofre um acidente e acaba perdido em uma galáxia desconhecida.

Então, o protagonista precisa explorar vários planetas alienígenas exóticos em busca de seres e criaturas amigáveis que podem ajudá-lo.

Grande parte do apelo da história está em fazer amizades pelos planetas, com NPCs que dando cartões “Migocard” (Imagem: Goodboy Galaxy/Divulgação)

Como já citado antes, Goodboy Galaxy é um jogo de plataforma, que tem foco em exploração não-linear e muito ‘backtracking’ (ou seja, ter que retornar e explorar novamente lugares já visitados) — o que acontece de forma inteligente.

Maxwell é bem equipado com jato, escudo e blaster para enfrentar os inimigos de cada planeta, mas os cenários te forçam a sair da zona de conforto por anular temporariamente uma dessas três habilidades do protagonista. Por exemplo, você pode ser forçado a ter que se virar sem o blaster em um momento, ou sem escudo (o que deixa o personagem com apenas uma vida). É uma mecânica simples, mas que adiciona uma boa camada de desafio e amplia o gameplay.

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Assim, a ideia é avançar enquanto lida com as adversidades constantes, enfrentando diversos inimigos e chefões, além de encontrar NPCs com missões que podem dar melhorias, itens ou uma amizade. Não fique com medo de explorar pouco um planeta antes de pular para outro. O jogo, na verdade, quer que você faça isso! Muitas vezes, a solução de uma quest está em outro lugar.

Em alguns momentos, você precisa até usar um inimigo ao seu favor para solucionar um quebra-cabeça de plataforma! (Imagem: Goodboy Galaxy/Captura de tela)

No entanto, Goodboy Galaxy também aposta em um level design arriscado porque reutiliza excessivamente os cenários e, se você ‘errar’ uma rota, pode ficar preso em uma área já explorada antes e ter que refazer o caminho todo várias vezes — o que, com o tempo, pode cansar o jogador com a repetitividade.

Senti também que a exploração em alguns planetas acontece de forma aleatória e sem rumo, uma vez que não há objetivo concreto (e nem mesmo Maxwell sabe o que está procurando direito). Em alguns momentos, avancei sem saber para qual lado deveria seguir, o que me deixou perdida dentro da proposta do jogo.

Seja como for, Goodboy Galaxy pode ser resumido como um Metroid fofo — e é aí que entramos nos aspectos realmente nostálgicos do projeto: a arte e a trilha sonora. As músicas têm um toque eletrônico e frenético, que parecem ter saído diretamente do início da década de 2000. O visual é todo pixelado e colorido com 32-bits (máximo alcançado pelo GBA), além de ter uma proporção de tela 3:2. O jogo é esteticamente lindo e chamativo, com animações muito bem feitas.

Bom menino das galáxias

Goodboy Galaxy tem tradução em português brasileiro, tornando-o possivelmente o primeiro jogo comercial de GBA a ter localização oficial em nossa língua.

A versão “abrasileirada” mantém o bom humor da história de Maxwell, com boas adaptações e até piadas, referências e trocadilhos que aproximam o game do brasileiro, como o cartão de amizades ser apelidado de “Migocard”, a citação do rei Roberto Carlos e do atemporal Molejo (sim!) e até a presença de sacadas divertidas como “vira-láctea” e “vida de cão”.

O trabalho de localização foi feito por um único tradutor brasileiro, Matheus Barreiros — que, curiosamente, teve uma mãozinha do NerdBunker para se tornar parte de Goodboy Galaxy. Lá em 2021, fomos um dos veículos que noticiaram o anúncio de meta batida da campanha do jogo, e Barreiros conheceu o projeto por meio da nossa matéria.

“Eu ‘tava’ enrolando em uma sexta-feira à tarde, abri o site do Jovem Nerd e dei de cara com a notícia, que falava sobre o primeiro jogo em 13 anos do Game Boy Advance. Li e vi que eles tinham uma demo gratuita disponível, então fui jogar e gostei muito! Não tive Game Boy na infância, mas joguei muito em emuladores. Aí me apaixonei na hora, achei incrível a ideia. […] Entrei em contato com o Rik e pedi para traduzir a demo”, conta Barreiros em entrevista ao NerdBunker.

Então, Barreiros ficou responsável pela tradução em português do texto e dos diálogos de Goodboy Galaxy, começando pela demo e, depois, assumindo a versão completa. Ele só não contava que se impressionaria tanto com o processo de tradução fornecido por Rik e Jeremy, que criaram uma ferramenta de localização para o projeto.

Geralmente, os tradutores de jogos recebem uma planilha, com apenas texto, para o trabalho. Mas Barreiros conta que a dupla criou um site com ‘assets’ visuais do jogo, como balões de diálogo e cartões de amizade, para todos testarem como os textos traduzidos vão aparecer no game. “Essa ferramenta é um site que eles disponibilizaram. A gente recebia os textos em inglês e podia testar direto no site para ver como iria aparecer no jogo […] Pra gente, sempre é melhor ter o máximo de informação. Foi muito legal como eles estavam disponíveis até para tirar dúvidas”, explica o tradutor. “Foi encantador, como um profissional da área, trabalhar nesse jogo com eles”.

Exemplo de como funciona a ferramenta de localização criada pelos desenvolvedores (Imagem: Captura de tela)

Barreiros também contou que o processo de tradução e adaptação foi desafiador, por ser um jogo de GBA, com uma proporção de tela quase quadrada.

“A tela é muito pequena, então tudo era meio ‘apertado’. Em inglês, os diálogos são mais curtos. Normalmente, as traduções em português ficam 25% por cento maiores do que [a versão original em] inglês. Então, em um jogo com tamanho padrão atual [widescreen], eu não teria que me preocupar com isso. Mas aqui sim porque tinha menos espaço para trabalhar”.

O tradutor explicou que teve que ser bastante criativo para conseguir encaixar as traduções dentro dos limites de caracteres — e, para isso, teve a ajuda da revisora Jana Bianchi, que curiosamente também é uma das escritoras de As Aventuras de Feldon & Alma, um livro próprio no financiamento coletivo Tesouros de Ghanor! “Eu quis trabalhar com uma mulher como revisora porque ela trazia um olhar diferente. […] Ela me ajudou muito com sugestões e detalhes”, conta Barreiros sobre Bianchi.

Por fim, Barreiros revelou algumas curiosidades de bastidores. Por exemplo, por causa do tamanho limitado ocasionado pela proporção, os desenvolvedores tiveram que descartar a opção de ter o jogo em russo, uma vez que os textos simplesmente não cabiam dentro da tela! Além disso, Goodboy Galaxy também será o primeiro cartucho oficial de GBA em árabe.

Com pequenos recordes, detalhes curiosos e uma história maluca sobre um viajante canino pelo espaço, o jogo nostálgico de Rik e Jeremy conquista um lugar especial entre os títulos de Game Boy Advance — e merece atenção de quem quer uma experiência que literalmente é uma viagem no tempo.


Goodboy Galaxy está disponível para GBA e com venda digital do arquivo do jogo. O título também chega para PC e Nintendo Switch no início de 2024.

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