Tido como um dos jogos mais esperados de 2023, Starfield tinha uma tarefa árdua pela frente: agradar os jogadores e não se perder no seu próprio exagero.
Afinal, o mais novo RPG da Bethesda quer ser um pouco de cada um dos grandes gêneros do videogame, mirando a busca da sua própria identidade. Será que ele conseguiu?
Muito tempo depois da Terra
O ano de 2330 é o ponto de início da aventura de Starfield. Mas, se olharmos o site oficial ou até mesmo algumas informações extras que o jogo nos dá através de documentos especiais, a história começa realmente em 2050, com a chegada dos humanos a Marte. Mas o que aconteceu com a Terra nesse tempo todo?
Essa e muitas outras perguntas são respondidas durante o game – minha recomendação é que você dê uma passadinha no Sistema Solar, visite a Lua e a Terra para tirar suas próprias conclusões.
A narrativa principal do jogo gira em torno do jogador ingressando à Constelação, um grupo muito antigo e particular de exploradores espaciais. Com você na equipe, a Constelação tenta desvendar os mistérios envoltos em certos artefatos descobertos a pouco, com propriedades únicas. O pensamento do grupo é que provavelmente não foram criados por humanos.
A jornada é longa e envolve uma gama de personagens que serão apresentados a você aos poucos, graças ao sistema de companheiros de Starfield. Cada um dos membros da Constelação pode se tornar seu companheiro de aventura. Eles garantem atributos especiais na sua jornada, que complementam as suas habilidades (se você assim desejar).
Um dos grandes aspectos do game está no seu relacionamento com os NPCs. O ideal é ficar amigo deles, algo que garante uma ajuda necessária em certas batalhas ou negociações. Também é possível flertar com qualquer integrante da Constelação e outros NPCs que venham a ser seus companheiros.
No meu caso, me aproximei tanto de um dos NPCs, que acabei casando cedo na aventura. Isso ainda não me gerou nenhuma melhora de atributo, apenas uma celebração especial e um certificado de casados. Sem DRs por enquanto.
Vivendo a sua própria vida dentro de Starfield
Provavelmente seria mais fácil escrever um diário de aventuras em Starfield do que uma crítica do jogo. É muito injusto criticar certas experiências encontradas no game, que podem aparecer de formas completamente diferentes a cada um dos jogadores, já que suas escolhas sempre mudam alguns detalhes e como certos elementos narrativos se apresentam. O que podemos fazer é falar da nossa experiência durante essa jornada, que durou aproximadamente 50 horas.
Desde o momento inicial do jogo, quando montamos nosso personagem, as escolhas já passam a atuar de forma intrínseca dentro da trama. Por exemplo, certas origens do avatar do jogador estarão ligadas diretamente com quais facções ele poderá se relacionar durante o jogo. Não ser capaz de ingressar em alguma dessas facções significa perder chances de aventuras únicas.
Existe uma opção na hora de criar o boneco que apaga o seu passado, garantindo passe livre em qualquer facção que desejar fazer parte. Isso vale para a União das Colônias, a Confederação Freestar, a Ryujin Corporation e até mesmo os Piratas Escarlates, se assim preferir. É legal avisar também que cada uma dessas escolhas sobre o passado do personagem garante habilidades destravadas, que podem facilitar muito a jornada num primeiro momento.
Como você segue o conteúdo que o jogo lhe apresenta também é um ato bastante pessoal. Isso porque Starfield pode ser esmagadoramente opressivo no começo, por conta da quantidade de informação que é despejada no seu colo já na primeira hora de jogo. Dá até para pedir conselhos aos seus companheiros NPCs, sobre o que eles acham que seria mais interessante para começar.
Curiosamente, essa escolha pouca importa. Todas as missões, mesmo as que parecem urgentes, continuarão na sua lista de tarefas até que sejam concluídas. É como se o tempo congelasse a partir do momento que você deixa uma missão de lado por um período. Também podemos simplesmente largar tudo e fazer outra coisa em qualquer momento da missão (o que pode ser um pouco anticlimático em alguns casos, mas extremamente vantajoso para nós, jogadores).
Não se assuste, aperte os cintos e tenha uma experiência divertida sem que a urgência das missões atrapalhem o seu aproveitamento.
Muitas habilidades para destravar
Starfield dá as ferramentas ao jogador para fazer o jogo funcionar como ele preferir. Se gosta de ação, tiroteios não vão faltar. Para complementar, basta subir de nível todas as habilidades relacionadas aos combates com armas de fogo. Há uma grande variedade de equipamentos, desde armas tradicionais da “Velha Terra”, como escopetas e revólveres clássicos, como também as clássicas armas laser, munições específicas e tudo que o fará se sentir no futuro de verdade.
O sistema de evolução no jogo é bastante simples, porém, burocrático. Aliás, o que não falta são situações que se estendem em voltas absurdas para completarmos nossos objetivos. Não caia na conversa do “Me faz um favor rapidinho” de algum NPC, porque nunca é rapidinho.
Logo no começo do jogo, por exemplo, um NPC lhe pede ajuda com uma árvore centenária localizada bem no centro de um dos distritos de Nova Atlântida. A missão, que parecia ser uma simples coleta de marcadores de terreno, de repente se transforma. Então somos envolvidos numa disputa de funcionários, roubo de documentos (isso se você aceitar roubar, porque sempre tem um caminho mais longo), e viagens espaciais até Cheyenne, sede da Confederação Freestar. Pelo menos o tempo é seu aliado nessas horas (no sentido de fazer quando estiver mais disposto).
De volta ao sistema de evolução, cada ponto ganho pelo jogador pode ser trocado por uma das habilidades espalhadas por cinco abas: físico, social, combate, ciência e tecnologia. Ao ativar alguma habilidade nova, a mesma possui um sistema de ranqueamento de quatro níveis que melhoram o seu desempenho. E, para destravar cada um dos novos Ranks da habilidade, é necessário cumprir certos requisitos – como derrubar cinco naves com a mira da sua nave para habilitar o próximo Rank, por exemplo.
Ao infinito e além
As habilidades também funcionam como “qualidade de vida” em Starfield, principalmente no quesito exploração: incluindo caminhada, quantidade de itens carregados e mochila jetpack. Exatamente por isso, vale muito a pena aumentar o limite de peso carregado (para levar mais itens consigo), melhorar o seu oxigênio (para correr por mais tempo e mais rápido) e a sua mochila jetpack (para voar mais) durante os momentos de exploração do jogo. Caso contrário prepare-se para dores de cabeça.
Starfield não conta com veículos terrestres. A nave é a sua única forma de locomoção veicular. Assim, suas habilidades físicas – e paciência – são postas à prova na hora de explorar alguns dos mil planetas inabitados dos Sistemas Colonizados, nome dado ao conjunto de sistemas de planetas fora do Sistema Solar que poderá ser explorado no game.
Muitos dos planetas de Starfield são gerados proceduralmente, pelo menos na parte de geografia. Certos elementos físicos, como construções e cavernas, são criações dos desenvolvedores, mas são inseridos nesses planetas de forma aleatória. Ou seja, não é possível mapear os planetas em busca de objetivos específicos, e cada jogador verá os elementos de forma diferente. No mesmo contexto, a grande maioria desses planetas é inabitada.
Certas viagens aos confins da Via Láctea servem apenas para gente entrar num planeta e descobrir que não tem nada lá além de alguns recursos minerais que podem ser coletados para a criação de novos itens.
É difícil mensurar o tamanho de Starfield. Temos no game uma espécie de “mapa mundi” com todos os sistemas estelares disponíveis. E cada um desses sistemas possui seus próprios planetas. Nessa contagem, os desenvolvedores confirmaram cerca de mil planetas à disposição do jogador a partir do momento em que ele instala o game.
Flora e Fauna em Starfield
Com exceção dos planetas apresentados durante a campanha principal, é difícil categorizar a fauna e flora de Starfield como “diversificada”. Claro, isso é um ponto de vista ligado diretamente à condição de “mil planetas para serem explorados”.
Se avaliarmos somente a quantidade de planetas apresentada de forma linear durante a jogatina da campanha principal, diria que a Bethesda fez um excelente trabalho. A jornada segue linda e maravilhosa por planetas cheios de vida, com vegetações que vão desde o mais tradicional à maior maluquice possível, com flores neon e gases aqui e ali.
As construções do jogo dão um show à parte. Das grandes cidades, como Neon, Nova Atlântida, Cheyenne, ou colônias de mineração como Cidônia, em Marte, tudo é extremamente detalhado e cheio de vida. Aliás, vale um cuidado extra por onde anda nas cidades: não perceber uma placa de “apenas pessoal autorizado” no canto do cenário, pode lhe render algumas horas na cadeia.
A vida animal também tem seu charme. Não é extremamente deslumbrante, mas algumas das criaturas feitas para o jogo são bem divertidas. Em sua maioria, os animais possuem peles grossas e são agressivos, se chegarmos perto, sempre andando em bando. É o tipo de perigo com o qual é necessário ficar atento.
Já as condições atmosféricas dos planetas podem render ao jogador tosses, infecções por radiação e gases, além de fraturas e outros debuffs. Esses status negativos funcionam exatamente como situações em que inimigos nos envenenam ou paralisam em RPGs tradicionais.
A grande maioria dos debuffs afetam diretamente a vida, porém, leva tempo até que seja necessário se preocupar de verdade com eles. Não é porque estamos sendo banhados pela radiação solar de um determinado astro luminoso de um planeta qualquer, que precisamos acelerar nossa exploração. Claro, os danos à sua vida são “fixos” – o poder de recuperar sua energia em 100% com itens vai diminuindo –, mas é numa escala tão lenta que não ficamos com aquela tensão no ar. Ter em mãos uma grande quantidade de remédios ajuda. Bem vindo à vida real (dentro do game).
Exploração e entrepostos
Além dos elementos que dão vida aos planetas, como fauna e flora, existem instalações, cavernas e outras construções mais específicas, que foram criadas pelos desenvolvedores e inseridas no contexto. Então, mesmo em planetas desertos, às vezes há alguma coisa para explorar além da estrutura do próprio planeta (litosfera, atmosfera, hidrosfera e biosfera).
Outra ponto de atenção: apesar da liberdade de exploração, certos sistemas estelares possuem um nível inicial para ser explorado. É possível viajar nível 1 e explorar qualquer planeta? É, porém, se a sua nave for atacada por algum pirata espacial de nível superior, provavelmente o game over virá a cavalo.
Em determinado momento do jogo podemos recorrer a totens de autoatendimento com missões de facções que podem ser realizadas pelo jogador. E lá tem de tudo: desde exploração nos confins do universo a caça-recompensas de criminosos terríveis. Algumas dessas missões estão em planetas longínquos e, logo quando chegamos nele, podemos notar um nível bem mais alto que o seu próprio, indicando que esta é uma missão para mais tarde. Pode tentar realizá-las? Claro, o jogo não vai proibi-lo, mas vai avisá-lo de que talvez seja demais para você.
Desbravar planetas em Starfield é escanear tudo que é diferente e apita no seu sensor. É ok na primeira vez, na segunda é mais ou menos e depois só fica chato e repetitivo. Mas essa é também a função do jogador como membro da Constelação, um grupo de exploradores espaciais bastante notórios no universo do game. E não basta apenas viajar até o planeta X ou Y, mas também estudá-lo, criar um assentamento e buscar formas de tirar vantagens dos seus recursos naturais.
Aqui entram os entrepostos, uma espécie de “minigame” (na verdade, não tem nada de mini) que diverge bastante da missão principal. Eles são uma espécie de Centros de Pesquisas e moradia que podem ser construídos mediante a utilização de recursos naturais.
Cada planeta é rico em determinados recursos (quase todos da nossa tabela periódica), e cabe a nós, como futuros cientistas interplanetários, extraí-los da natureza e criar um novo propósito para eles. Exemplos: uma nova cadeira, um cabo de força, uma armadura reforçada ou até mesmo uma arma de última geração.
Toda a parte do jogo ligada ao gerenciamento de recursos e suas aplicações científicas começa com a extração dos materiais e a criação de um entreposto para estudar cada um desses planetas.
Essa parte de Starfield poderia até mesmo ser vendida separadamente como um adendo ao game, porque necessita de completa atenção do jogador, seja no gerenciamento, construção de base, ou até mesmo contratação de pessoal – com quadro de funcionários e pagamentos de salários. É um lance gigantesco e que não deu para ser explorado em sua totalidade até a publicação desta crítica, mas chegaremos lá.
Sua própria frota estelar
Já que entramos no assunto de jogos de gerenciamento, outro grande aspecto de Starfield diz respeito à sua nave espacial. É ela que vai levá-lo do Alfa ao Ômega do universo num piscar de olhos.
Pilotar a nave é legal, mas é preciso mais do que conhecimento de piloto para levá-lo adiante. No melhor estilo Need for Speed, é possível personalizar cada aspecto do veículo, dos motores de dobra espacial, aos compartimentos de carga, cabines de piloto e até mesmo a cor de cada espaçonave. Só não vai dar para colocar neon embaixo delas.
Personalizar a nave requer um pouco de paciência, já que é preciso ficar atento a detalhes como encontrar as melhores peças com preços mais convidativos e escolher entre armas, motores ou espaço de carga.
Tudo é equipado manualmente pelo jogador, através de um sistema que transforma sua nave em blocos (uma versão mais robusta de um minigame em Kingdom Hearts). Sério, a quantidade de coisas que dá para fazer ali é fora do normal.
As batalhas espaciais também necessitam de um cuidado extra, já que o jogador precisa ficar atento às manobras, ao mesmo tempo que gerencia toda a energia da nave através de um menu ao lado esquerdo no cockpit. Motores de dobra precisam ser energizados manualmente, enquanto a energia dos lasers pode ser direcionada aos escudos quando os mesmos estão sendo destruídos, e por aí vai.
Nas lutas, ao invés de destruirmos as naves inimigas, podemos também embarcar nelas e torná-las nossas, aumentando a frota. Só é preciso ficar atento também aos custos que isso vai acarretar, ou você acha que estacionar uma nave no espaçoporto de Jemison, em Nova Atlântida, é barato?
Escolha o seu lado (ou todos os lados) da disputa
Existem muitas facções de extrema importância no universo de Starfield. A principal delas é a União das Colônias (U.C.) uma espécie de governo intergalático que comanda grande parte dos Sistemas Colonizados.
Com um exército poderoso, a U.C. age como um governo militar, e suas regras precisam ser seguidas à risca. O governo deles acaba se tornando um grande problema a outras facções, como a Frota Escarlate ou a Confederação Freestar.
Por falar neles, a Confederação Freestar atua como uma oposição e força do povo. Mais simples, parecem personagens de Red Dead Redemption, claro, se não estivessem há muitos anos-luz da Terra.
Esses cowboys espaciais lutaram contra a exploração sem regras da U.C. há mais de 100 anos da história atual, perderam alguns confrontos, ganharam outros, e se tornaram uma das grandes facções quando certas decisões precisam ser tomadas em grupo para a manutenção da paz.
Dependendo de como o personagem do jogador foi criado (na hora de escolher o passado lá na criação de personagem), é possível ingressar em qualquer um desses grupos. Inclusive, é possível até mesmo arrumar emprego na Corporação Ryujin como um executivo sem escrúpulos.
A quantidade de conteúdo destravado ao jogador durante esses momentos é avassaladora. Algumas das missões mais legais do jogo estão sob esses contratos – não deixe de ingressar na U.C. e lutar contra Terrormorfos, conhecidos como os predadores Alfa do espaço.
A principal questão aqui é em que momento do jogo ingressamos nesta nova jornada, certo? Talvez falte uma pausa entre as missões principais. Assim que você finaliza uma delas, uma nova aparece, e lá vamos nós de novo. Aquelas pausas entre missões dos RPGs não acontecem aqui, é o próprio jogador que precisa dar um tempo (se quiser).
Na minha experiência com o jogo, acabei entrando de cabeça nas missões da U.C. e deixei de lado a trama principal por pelo menos umas sete horas de jogatina. Só parei porque parecia que estava jogando um outro game – nem lembrava quem era Constelação mais. Mas vai de cada um mesmo (só não realize a missão final antes de completar as sidequests).
Starfield é jogo para mais de 300 horas, sem exagero. Não dá para sequer imaginar o que a comunidade vai criar quando por as mãos no game. A esperança é que tudo funcione perfeitamente, mas é claro que muitos problemas devem surgir daqui para frente.
O game se esforça em entregar uma experiência nova a partir da união de um monte de gêneros diferentes de jogos – RPG, simulação, gerenciamento, construção –, porém, são raros os momentos em que tudo se conecta como uma mesma experiência.
Não é horrível, mas não nos traz a sensação de novidade tão aguardada no mundo dos videogames. No entanto, é uma evolução dentro dos próprios RPGs da Bethesda, com a maior certeza do mundo. Se gosta de um RPG encorpado e cheio de coisas para fazer, chegou o seu momento.
Starfield chegará ao mercado em 6 de setembro, para Xbox Series X|S e PC.
Essa review foi feita com uma cópia do jogo cedida pela Bethesda Game Studios.
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