O anúncio da série Eco pegou muitos fãs da Marvel de surpresa, já que se trata de uma personagem pouco conhecida nas HQs e que não se destacou em Gavião Arqueiro a ponto de fazer o público clamar por seu retorno. Para rebater a descrença, a equipe responsável temperou o projeto com ingredientes que, no papel, são diferentes e interessantes. Infelizmente, tal mistura não basta na prática.

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A produção começa recapitulando e expandindo a jornada conhecida até ali. Parte de uma família nativo-americana, Maya Lopez (Alaqua Cox) é acolhida como uma espécie de sobrinha e capanga pelo Rei do Crime (Vincent D’Onofrio). Relação que dura até ela descobrir que o vilão foi responsável pela morte de seu pai e decidir vingá-lo. Crente de que havia eliminado Wilson Fisk, conforme mostrado na série dos arqueiros, agora ela aspira se tornar a nova chefona do crime de Nova York. Mas, antes, precisa voltar para casa, onde confronta o próprio passado antes de seguir em frente.

Enquanto explica a origem da personagem a novos espectadores, a produção preenche lacunas que servem de base para a trama principal e apresenta alguns dos diferenciais em relação ao universo do qual faz parte. O primeiro é a herança da personagem e sua família como parte da nação nativo-americana Choctaw, cuja cultura e costumes influenciam fortemente a trajetória da protagonista.

Resultado de uma colaboração da equipe, formada por pessoas nativo-americanas, com o povo Choctaw do mundo real, essa parte da trama enriquece a formação e as possibilidades da personagem. Aliás, da série como um todo, já que a narrativa traz um encanto inicial ao visitar outros períodos históricos e prestar homenagens à história da sétima arte ao trazer um segmento inspirado no cinema mudo. Algo que, por sua vez, conecta as habilidades e dons de Maya Lopez em conceitos inéditos no universo Marvel até então.

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O segundo diferencial é a tão falada violência explícita, que deu a Eco o selo de “primeiro lançamento da Marvel para maiores”. Apesar de ótima para o marketing, a ação não é brutal como se vende, e não são borrifadas de sangue adicionadas por computação gráfica que mudam isso.

A pancadaria segue o padrão do MCU, o que não seria exatamente um problema se a série não tentasse evocar algo além, como a do Demolidor na Netflix, ao ensaiar uma crueza que nunca se concretiza. Um comentário que serve também para a participação do próprio Homem Sem Medo, desperdiçada ao ser resumida à pancadaria.

A forma como os dois grandes diferenciais se colocam em tela ajuda a entender os triunfos e defeitos de Eco. Pelo lado positivo, a produção traz boas ideias e viradas criativas o suficiente para manter a jornada da personagem envolvente. A mistura entre crime urbano e uma mitologia com toques sobrenaturais tem uma construção interessante tanto pelo mistério quanto pela forma como fortalecem a jornada de uma personagem cujo grande atrativo, até ali, era a ligação com outros heróis e vilões do universo do qual faz parte.

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Voltar ao passado de Maya Lopez para entender suas dores e filosofias é uma decisão acertada que dá a Alaqua Cox a possibilidade de evoluir sua performance na pele da personagem. O crescimento da atriz ao longo da jornada é visível e abrilhanta o projeto, especialmente considerando que ela divide tela com Vincent D’Onofrio, um grande ator que claramente ama estar na pele do Rei do Crime.

O problema é que boa parte dessas boas ideias acabam sabotadas pelo andamento da própria produção, que sofre para trilhar os caminhos interessantes que aponta. São várias as falhas narrativas na série, que vão desde a falta de espaço para o elenco de apoio, saltos ilógicos e até quebras de regras e condutas estabelecidas por ela mesma.

Uma situação bastante repetida ao longo dos cinco episódios de Eco, por exemplo, é a da narrativa preparar um grande momento para retratá-lo de forma tão desprovida de emoção e impacto, que o torna apático. É possível vislumbrar a grandeza que a direção e o elenco pretendiam imprimir nessas cenas, mas o resultado final raramente chega lá.

Essas questões, que se somam ao longo da temporada, diluem a força da história e prejudicam até mesmo as partes mais interessantes. Se a incorporação da herança familiar da personagem começa bem cuidada, o final apressado a reduz a uma fonte de superpoderes e respostas fáceis – algo que já havia prejudicado outros filmes e séries da Marvel. O mesmo ocorre com o suspense urbano, especialmente após um episódio inteiro dedicado ao sequestro mais mal executado da ficção.

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São problemas que prejudicam a evolução da personagem principal. Ao fazer com que respostas caiam do céu e falhar em gerar conexões com sua heroína, Eco dilui as próprias forças e chega ao fim como mais uma produção comum do Universo Marvel. Apesar de ser plenamente capaz de divertir e prender por algumas horas, ela não escapa do gosto amargo deixado pelo grande potencial desperdiçado de algo que poderia ser muito mais.