Em 2019, a série de The Boys aproveitou a empolgação em torno dos super-heróis nos cinemas e na TV e apresentou uma subversão sangrenta e obscena. A abordagem deu tão certo que a produção se tornou o que criticava e deu origem a uma franquia que chega ao segundo derivado – lembra da animação Diabólicos? – com Gen V. Para a alegria dos fãs, a nova produção do Amazon Prime Video começa com o pé direito, mostrando que vai muito além de um caça-níquel.
Gen V retorna a The Boys por uma nova perspectiva. Esse ainda é o universo habitado por super-heróis que, em sua maioria, são egoístas ou meros produtos de uma grande corporação. Porém, agora o foco é uma universidade de supers, um ambiente focado em preparar donos de poderes para seguir carreira – como combatentes do crime ou celebridades para vender produtos.
A nova protagonista é Marie Moreau (Jaz Sinclair), uma jovem super que tem o poder de manusear sangue. Focada em se tornar uma grande heroína por conta de um evento traumático do passado, ela recebe a chance de ouro ao ser selecionada para a renomada universidade de supers Godolkin University. Porém, é claro que as coisas não são exatamente como ela espera, e não demora muito para a jornada tomar caminhos sinistros.
Os primeiros episódios de Gen V marcam um início empolgante para a produção. Em primeiro lugar, ela mantém a essência que tornou a original tão querida. Ao longo de três temporadas, The Boys lapidou uma estrutura que usa violência, sexo e humor absurdo para atrair a atenção para uma história cativante e bem contada. Uma herança que o derivado aproveita logo de cara.
Não é por acaso que o capítulo inicial aplica uma dose concentrada dessa fórmula, ao encapsular muitas dessas dinâmicas em menos de uma hora. Há obscenidade, sangue, comédia bizarra, piadas com cultura pop e grandes reviravoltas, tudo para convencer o público de que essa não é uma versão diluída ou menor da antecessora. Porém, mais do que serem usados para viralizar nas redes e atrair curiosos, esses truques funcionam por não serem o foco principal, mas sim o tempero do que realmente conduz a série: a história.
Ao invés de tratar a premissa de “The Boys em uma universidade para supers” de forma genérica, Gen V faz um bom trabalho em estabelecer identidade própria. É possível perceber inspirações em filmes e séries adolescentes de Hollywood, assim como uma caracterização atenta ao que está na moda entre os jovens, protagonistas e público-alvo da produção.
Assim, a produção costura o filmes highschool (ou colegiais) com o de super-heróis no tom e também na performance de seu elenco principal. Desde a protagonista de origem humilde que entra nesse mundo em busca do sonho, passando pelo grupinho mais popular e até a colega de quarto divertida que apoia a heroína: nada é inédito, mas é conduzido com foco no desenvolvimento desses personagens, que cativam logo de cara.
Apesar de pertencer a estereótipos, como os descritos acima, os protagonistas de Gen V conquistam pela forma como se desenvolvem e interagem. As dinâmicas e relações entre eles conduzem a trama e se valem de um elenco carismático o suficiente para fazer a audiência torcer por eles e se sentir parte da turma.
Especialmente porque os episódios iniciais pegam a deixa das histórias de amadurecimento e usam superpoderes como metáforas para questões típicas da juventude. O paralelo entre dons e transtornos, além da dificuldade em se encaixar neste mundo corporativo corroído pelo cinismo, traz um frescor que faz jus à proposta. Mesmo que essas questões sejam tratadas com pouca sutileza.
Essa sensação de novidade é um grande trunfo desse início, pois a produção não soa deslocada de The Boys. Pelo contrário, há um esforço considerável em integrar a Godolkin University a esse universo sem forçar a barra. Em sua maioria, essas conexões são feitas de forma orgânica e servem ao propósito de expandir o que já era conhecido sem roubar o foco da nova história.
Outra herança que Gen V demonstrou nesse início foi o valor de produção. Ao contrário da original, que começou modesta e foi ampliada a cada temporada, a derivada já começa com um belo tratamento visual. A escala da série e a qualidade dos efeitos visuais chamam a atenção logo de cara, uma combinação cuja cereja do bolo são os combates, que aproveitam essa estrutura em cenas empolgantes.
A combinação desses fatores faz com que a estreia do derivado marque um retorno ao universo de The Boys em grande estilo. Com mais cinco episódios pela frente, a expectativa é positiva. Afinal de contas, a produção demonstra ter estudado o bastante para não repetir de ano. Resta saber se foi o bastante para passar de ano com louvor ou se vai se contentar com uma estreia bombástica e encerrar na média.